sexta-feira, 25 de setembro de 2009

Sessão privê de "À Deriva"


Confesso que meu grande sonho no escurinho do cinema era assistir a um filme absolutamente sozinho. Hoje, na sessão das 16h50, do Moviecom Praia Shopping, realizei o desejo acalentado durante anos. O filme "premiado" foi À Deriva (Brasil, 2009), do cineasta pernambucano Heitor Dhalia. Saí da sala regozijando-me pela concretização do sonho e por ter assistido a um filme digno do ingresso pago.


Ainda confesso que fui sem muito ânimo conferir a fita, vez que lera críticas desfavoráveis, comentários desairosos e vira o trailer e não gostara. À Deriva sustenta-se no ótimo roteiro de Heitor Dhalia que nos surpreende com revelações e surpresas do início ao fim. A história parece banal e "batizada", mas o pulo do gato é o roteiro inventivo de Dhalia, o que só fez corroborar meu pensamento de que os cineastas pernambucanos dominam atualmente o cinema brasileiro, vide o candidato a gênio Cláudio Assis.


O enredo se passa numa praia de veraneio e gira em torno da desagregação do casal Mathias (Vincent Cassel), escritor francês radicado no Brasil, e a professora Clarice (Débora Bloch), com seus três filhos. A adolescente e primogênita Filipa (Laura Neiva) presencia todo o complexo processo de implosão do casamento, especialmente o namoro do pai com a também veranista americana Angela (Camilla Belle). Nesse triângulo amoroso, Filipa vai descobrindo ela mesma desejos, experimentando frustrações e o quanto é difícil sustentar uma relação conjugal desgastada pelo tempo. O plus de Heitor Dhalia vem no final da trama quando Filipa conta para a mãe que o pai tem um caso extraconjugal com a tal Angela, supostamente o pivô da separação. Clarice soterra o "heroísmo" e a cumplicidade de Filipa ao revelar que o pivô da separação, na real, é um aluno dela 10 anos mais novo. É demais para a adolescente que se entrega ao barman (Cauã Reymond) do restaurante frequentado pela família, numa atitude mesclada de decepção, revolta, descoberta do prazer e autoafirmação.


Heitor Dhalia estreou na direção de um longa-metragem em Nina (2004), cujo roteiro é livremente inspirado no livro Crime e Castigo, de Fiódor Dostoievski; seu segundo filme, O Cheiro do Ralo (2007), teve como base o livro homônimo de Lourenço Mutarelli. À Deriva, terceiro filme, é também seu projeto mais pessoal. Muitos são os méritos do celuloide, a começar pela escolha do elenco, com o ótimo trio Vincent Cassel - com seu sotaque afrancesado -, Débora Bloch e a estreante Laura Neiva; além da fotografia deslumbrante, figurinos de Alexandre Herchcovitch e a música assinada por Antonio Pinto.


À Deriva teve pré-estreia na 62a. edição do badalado Festival de Cinema de Cannes, dentro da mostra Um Certo Olhar, e na Riviera foi bem recebido. Filipa junta-se às minhas outras duas ninfas/musas estreantes do cinema nacional: Silene (Cristina Aché), de Os Sete Gatinhos (1980), e Alice (Flávia Monteiro), de A Menina do Lado (1987). Para Nabokov babar na gravata.

Um comentário:

  1. Boa análise, meu caro.
    Sozinho no cinema;
    ainda não aconteceu comigo.
    Mas ainda não vi o filme.

    Um abraço.

    ResponderExcluir